Opinião por José Carlos dos Anjos Wallach*
Após algumas semanas de repercussão das recentes medidas de controle sanitário, um novo decreto paraibano estabelece limites para eventos privados e condiciona o acesso do público à apresentação de comprovante de vacinação completa. Além disso, reforça a recomendação aos municípios para que não realizem eventos de final de ano em espaços abertos.
A repercussão, negativa inclusive, se dá sobre uma questão de óbvia incongruência: qual a lógica de permitir eventos privados, se os eventos públicos são cancelados, corretamente, por questões sanitárias?
Cabedelo, por exemplo, foi uma das primeiras cidades a anunciar que não realizará o réveillon público em sua orla marítima – outras 64 cidades já anunciaram o mesmo, incluindo a Capital João Pessoa.
Com isso, Cabedelo evita que o coronavírus, ainda presente e matando, tenha mais uma chance de reaparecer mais forte. Numa emissora de rádio, entretanto, o prefeito disse que sua decisão não se estende aos eventos privados porque lá – segundo ele – é possível se “montar um esquema sanitário” para controlar o acesso das pessoas.
O prefeito de Cabedelo deu a senha para todos justificarem a liberação dos eventos privados.
O tal controle na portaria daria aos empresários do ramo de entretenimento o passe para manter suas festas. Barzinhos e restaurantes da orla poderão realizar seus mini-réveillons, por exemplo? Hotéis dessa área poderão realizar festas com fogos e vender entradas às suas dependências? As barraquinhas da orla de Tambaú e Cabo Branco, em João Pessoa, poderão fazer seus mini-eventos, vendendo suas mesas? Isso não é aglomeração?
Sem falar nos grandes eventos de verão, que se realizarão, sobretudo, em janeiro e fevereiro. Um deles será o Fest Verão PB, marcado para os dias 8, 15 e 22 de janeiro de 2022. Na sua conta de Instagram, o evento pede que o público se vacine e “venha curtir com segurança”, um gesto bacana, mas insuficiente. É preciso dizer aos quatro cantos que proibirá a entrada de quem não está adequadamente vacinado – e cumprir a determinação oficial.
Quem vai fiscalizar?
Deixar com o empresário, louco para ganhar dinheiro, a tarefa de fiscalizar a si próprio e restringir os lucros, proibindo o acesso de quem não está vacinado, repete o jargão popular que alerta sobre o perigo de entregar o galinheiro à raposa – nesse caso às raposas.
Nós já vimos um exemplo disso, na vaquejada do Parque Bemais, onde a boiada estourou e até os artistas tiveram dificuldade de chegar ao palco, tal o volume de público que compareceu ao evento, sem qualquer fiscalização.
É certo que o poder público nem tem força, nem gente suficiente, para garantir essa fiscalização. Nunca teve.
E, numa situação hipotética, se um fiscal de saúde pública se deparar com um grupo de pessoas sem a carteirinha de vacinação dentro da festa ou do show, esse fiscal terá o poder de parar tudo? O que acontecerá: multa? Prisão? Ao menos um carão público pelo microfone?
Nada que o fiscal faça adiantará, já que o princípio do controle sanitário terá sido desmontado.
É óbvio que os eventos privados são importantes para o turismo e para circulação de dinheiro na economia local, muito combalida. Mas estamos ainda vivendo uma pandemia e este fato era o que deveria reger as medidas de restrição de circulação de pessoas, não interesses econômicos.
Até porque, se houver um reforço da contaminação, continuaremos nessa armadilha. Será assim até entendermos que a guerra ainda não acabou.
Senão, vejamos: há um mês, os números sobre a pandemia no país nos davam uma quase certeza que iríamos nos confraternizar na praia – e realmente seria algo muito bonito.
Mas a pandemia recrudesceu, a África descobriu nova cepa do vírus, o mundo começou a se fechar novamente. Apesar de todo sacrifício feito até agora, não é a hora de amolecer com esse vírus. Mais um momento de cuidado pode ser nossa redenção dessa situação. É o que todos realmente querem.
*José Carlos dos Anjos é jornalista e autor do Blog Festar Muito
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